quinta-feira, 17 de novembro de 2011

O Simbolismo do Corpo Feminino



Dona de casa, mãe exemplar, esposa fiel. Sexualidade oprimida, opinião irrelevante, voz passiva, vida secundária. O perfil feminino mitificado na imprensa brasileira, na década de 60, não foge à regra do que estava disponível até então. O lugar feminino no sagrado, precursor da sua subserviência e representatividade secundária, permanece arraigado na sociedade patriarcal masculina. O que muda, na atualidade, é a roupagem que será dada para esse olhar, principalmente na década onde supõe-se descobrir o poder de compra e venda da mulher – tanto como objeto de vendas como de potencial consumidora.



O poder simbólico do olhar feminino inscrito nos corpos, nos costumes, na mídia, na alma feminina, é desvelado de forma a mostrar como a dominação patriarcal, presente na história da sociedade desde que a primeira mulher foi criada – segundo a Bíblia, depois do homem e graças à sua costela – perdura até os dias de hoje. O ‘segundo sexo’ dominado, e ao mesmo tempo emancipado, – segundo o movimento feminista de 68 – continua em sua via de dominação, com conotação de objeto sexual, porém esse poder agora está inscrito também em outras vias, como na imprensa.


Apesar do movimento feminista, da representação simbólica bem forte que as operárias mortas dentro de um incêndio numa fábrica em Nova Iorque, no dia 25 de março de 1911, ao exigirem direitos iguais aos dos homens e uma jornada de trabalho mais justa, a mulher virou ‘fetiche a serviço da lei de mercado’. Ícone da moda e do consumo, sua liberação nunca aconteceu, apenas mudaram os objetos que a subjugam e escravizam. Essa contradição foi um dos pontos estimulantes para o desenvolvimento deste projeto. Além disso, enquanto mulher e comunicadora, penso ser fundamental entender a relação desse poder simbólico lançado sobre a mulher para que, no futuro, essa visão seja modificada.


A conotação simbólica do corpo da mulher, ao longo do tempo, faz parte do imaginário coletivo. Antes, ele era povoado de acordo com histórias mitológicas e religiosas arraigadas no passado. Com o advento da mídia e supervalorização da imagem sobre o conteúdo, esse imaginário passou a ser construído em cima de outros caracteres, objetificado através das lentes translúcidas de um aparelho televisivo, das páginas de uma revista ou de um jornal.



Pode se dizer, que na modernidade, o princípio de reprodução da ordem social traz a lógica da mulher fetichizada através do corpo. A sociedade capitalista em comunhão com a cultura de massa criaram novos referenciais femininos para o imaginário. O mais misterioso e intrigante é entender o motivo que levou às mulheres, que outrora brigaram por direitos iguais aos dos homens, jornadas de trabalho reduzidas, direito ao voto, uso de calças compridas, entre tantas outras coisas, se renderem aos apelos midiáticos e se tornarem escravas do corpo.


Há também um fato curioso existente nesse poder simbólico inscrito sobre o olhar feminino. O mesmo corpo capaz de simbolizar um objeto sexual, principalmente se objetificado com roupas – ou mesmo sem elas – que transmitam sensualidade, simboliza o ‘segundo sexo’ que trabalha o dia inteiro, cuida dos filhos, lava, passa, cozinha. O corpo capaz de salvar, neste caso, é capaz de escravizar. A mãe é plena no momento da gestação e a prostituta é objeto no momento da copulação. Mas a prostituta também pode ser mãe, e a mãe também pode ser prostituta.


O ponto em comum presente nessas diferentes situações é a posição assumida pela mulher: ela é quase sempre subserviente, com o corpo a serviço do poder simbólico patriarcal inscrito no inconsciente coletivo, na “consciência da mídia”, no comportamento da sociedade. Mas não há só passividade, há muitas mulheres que lutaram e muitas que estão em plena atividade para romper paradigmas, com o olhar carregado de simbolismo que permeia a representação feminina. Aqui no Brasil, Leila Diniz foi uma dessas mulheres.


A atriz foi na contramão de um modelo societário vigente e, sem medo do que poderia lhe acontecer, vociferou à imprensa seus sentimentos avançados demais para serem compreendidos por aqueles acostumados a tratar o sexo frágil da mesma maneira subserviente. Somado a tudo isto, nos anos 60, vivia-se um período de repressão devido à ditadura militar. Foi uma década que marcou politicamente, culturalmente e ideologicamente a vida das pessoas. E ela estava lá, atuante, marcando a história feminina. Leila fez história e abriu um grande caminho para as gerações futuras.

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